Sobre o filme

Lindeiras é um filme que trata do sertão, histórico e também mítico, que aos poucos perde espaço e se desfaz. O nome Lindeiras é a designação utilizada décadas atrás para as cidades situadas às margens das linhas de trem. É através desse percurso, por trilhos enferrujados e esquecidos, que faremos uma viagem ao interior do sertão baiano, de Alagoinhas à Juazeiro, para olharmos com cuidado as paisagens e pessoas que compõem esse universo.

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Serrinha


Serrinha está na gênese da idéia do filme. De lá, onde os laços afetivos são ancestrais, surgiu a idéia para este percurso pelo desconhecido, pelas histórias de pessoas que compõem a paisagem da linha do trem.










sábado, 27 de novembro de 2010

Lamarão

A chegada em Lamarão foi surpreendente. Já tínhamos visto fotos da estação abandonada, mas em nada as fotos se pareciam com o que estávamos vendo ali de perto. É um cenário incrível. Uma grande extensão da linha de trem enferrujada contrastava com os dormentes assentados em pedras brancas. A linha vai até onde a perdemos de vista. Ali, me lembrei exatamente da poesia de Manoel de Barros, quando tentava fotografar o silêncio. Eu tentei, e como o poeta já disse, não é nada fácil. Como capturar a solidão dos mandacarus que resolveram crescer no telhado na antiga estação? Como traduzir em imagem o desejo deles de alcançar o céu? Dentro do filme, já sabíamos que Lamarão estaria de alguma forma, mas ainda não sabemos como. O que sinto, é como se ali fosse possível abrir um intervalo no espaço do filme para mostrar um outro tempo que prescinde do passar das horas. E aqui vou eu falando de tempo mais uma vez. Os mandacarus que nasceram no telhado da estação em Lamarão são um instante perdido no tempo.










sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Água fria

A passada por Água fria foi rápida. Aproveitamos que estávamos por perto para dar uma checada na estação, conhecer mesmo que de relance, a cidadezinha. No planejamento de Lindeiras, esta foi uma das cidades que ficou de fora. Quando os trens de passageiro funcionavam, Água fria era uma grande estação, e a cidade tinha uma grande área geográfica, Serrinha e Lamarão eram distritos de lá. Minha sensação é que Água fria ficou parada no tempo, pois continua uma pequena cidade enquanto Serrinha se desenvolveu a ponto de ser um centro regional.

A estação desativada é ocupada por casas de marimbondos. Voam desconcertados por todos os lados, o que me fez manter certa distância, por isso a constância dos planos gerais. Nas fotos em película, registros ousados feitos por Bruno que chegou mais perto dos insanos voadores.






E aqui, uma referência à criatividade do povo de água fria.


quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Santa Luz


Entre Queimadas e Serrinha, uma passada rápida por Santa Luz para encontrar um trem que vimos no meio da estrada. Em uma estação reformada de arquiterura moderna, a empresa que administra a concessão da linha montou uma base de monitoramento. Lá, tivemos mais informações sobre o trajeto percorrido pelo trem, e a viabilidade de pegarmos carona nessa cauda de cometa. Mesmo passando rapidamente pudemos perceber que não se trata de uma cidade tão pequena quanto Queimadas. No tempo que passamos na estação de Santa Luz, o trem estava parado aguardando autorização para prosseguir viagem até Salgadália. Partimos, com a esperança de vê-lo passar por Serrinha.


terça-feira, 23 de novembro de 2010

O ponto de partida


No dia 22 de novembro começou nossa viagem de pesquisa rumo a um sertão profundo que por enquanto é apenas um sentimento expresso de forma poética no projeto de Lindeiras, mas que aos poucos começa a ganhar forma, cores e sons. O ponto de partida escolhido foi o município de Queimadas, a 324km de Salvador.  A escolha de começar por uma pequena cidade do sertão foi uma forma de nos aproximarmos de um outro tempo onde os kilômetros e as horas não passam tão depressa. De fato, em Queimadas, nada tem pressa de acontecer, ao contrário, as coisas também não tardam. Tudo acontece na sua hora, sem aperreio, sem agonia. Por mais que o nome da pousada onde ficamos (Flesh - sim, flesh com E) remetesse à rapidez de um trem bala, o trem que procurávamos aqui anda a pouco mais de 30km por hora.

Uma imagem de Santo Antônio na entrada da cidade revela o padroeiro do lugar. Enquanto procurávamos a casa de Seu Corcino, melhor comida do lugar, íamos observando devagar a praça central, a igreja matriz e as ruas pequenas da calma cidade do interior. Depois de um breve descanso, saímos em busca da Rua da Estação. Em Queimadas, buscávamos uma ruína.

Faz pouco mais de um ano que parte do casarão da antiga estação desabou, assustando os moradores e materializando o sentimento de abandono que acompanha quem passa pela estação. Uma grande caixa d’agua com o logotipo da Leste Brasileiro é uma companheira silenciosa que sobrevive imponente, a poucos metros da antiga estação.

Segundo alguns de seus moradores, Queimadas é a cidade do “já teve”, e mesmo querendo evitar um mergulho nesse saudosismo tão profundo, sabíamos que por ali, falaríamos apenas do passado, do tempo que não volta mais. O dinamismo que a pequena cidade conheceu na época áurea do trem, não se parece em nada com a dispersão que vive agora tendo crescido para o lado de uma rodovia.

Foram horas de conversas com pessoas que ao nos receber, faziam uma viagem rumo às memórias de sua vida. Aos poucos ficamos sabendo que a mobília do casamento de Dona Zó chegou no trem noturno, junto com o amanhecer, há 47 anos atrás; ainda com alegria Isane nos contou das latas de água que ela carregava da estação até sua casa na época de seca quando o trem trazia “água da boa” de Serrinha para abastecer a comunidade de Queimadas. A estação de trem era o centro de abastecimento e festivo da cidade. Com a possibilidade de viajar para a cidade ao lado, insituiu-se o namoro intermunicipal, por isso a cidade vivia um alvoroço a cada anúncio de chegada da maria fumaça.

Em cada uma dessas histórias fomos somando afetos à nossa caminhada. Ao contrário da linearidade exata da linha do trem, para mim tem ficado claro que o Lindeiras se consituti fundamentalmente de linhas sinuosas que se confundem e desdobram nas encruzilhadas da memória.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Nosso guia pelo sertão de outrora

O Poeta Ascenso Ferreira é um dos guias do filme que aos poucos vamos desenhando. Sua poesia transita no limite em que o verso já é quase música, como observou Manuel Bandeira no prefácio de "Catimbó", livro de poemas lançado em 1927. Transcrevo abaixo, a poesia intitulada "Sertão", uma das referências poéticas e visuais do Lindeiras.


Sertão! – Jatobá!
Sertão! – Cabrobó!
– Cabrobó!
– Ouricuri!
– Exu!
– Exu!
Lá vem o vaqueiro, pelos atalhos,
tangendo as reses para os currais...
Blém... blém... blém... contam os chocalhos
dos tristes bodes patriarcais.
E os guizos fininhos das ovelhinhas ternas:
dlim... dlim... dlim...
E o sino da igreja velha:
bão... bão... bão...
O sol é vermelho como um tição!
Lento, um comboio move-se na estrada,
cantam os tangerinos a toada
guerreira do Tigre do sertão:
“É lamp... é lamp... é lamp...
é Virgulino Lampião...”
E o urro do boi no alto da serra,
para os horizontes cada vez mais limpos,
tem qualquer coisa de sinistro como as vozes
dos profetas anunciadores de desgraças...
– O sol é vermelho como um tição!
– Sertão!
– Sertão!




terça-feira, 16 de novembro de 2010

Um Rail Movie

No dia 22 de novembro de 2010, botamos o pé na estrada. Nos trilhos, dizendo melhor. Com um roteiro que envolve a visita a Alagoinhas, Serrinha, Lamarão e Queimadas, passaremos alguns dias conhecendo novas terras em uma jornada de imersão no sertão mítico que pretendemos criar no nosso filme.